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Gregori Ilych Warchavchik (Odessa, 2 de abril de 1896 — São Paulo, 27 de julho de 1972) foi um dos principais nomes da primeira geração de arquitetos modernistas do Brasil.

Chegou ao Brasil em 1923. Naturalizado brasileiro entre 1927 e 1928, projetou e construiu para si aquela que foi considerada a primeira residência moderna do país.

Warchavchik nasceu na cidade de Odessa, Ucrânia, então parte do Império Russo. Iniciou os estudos de arquitetura na própria Universidade Nacional de Odessa..

Em 1918 muda-se para Roma, Itália, ingressando no Regio Istituto Superiore di Belle Arti, diplomando-se em 14 de julho de 1920. Passa os dois primeiros anos de formado trabalhando para o professor e arquiteto neo clássico Marcello Piacentini (1881-1960), mais tarde conhecido como l’architetto del regime (fascista), e dirige a construção do Cinema-teatro Savoia (1922), em Florença.

Chega ao Brasil (segundo ele, “terreno preparado para minhas ideias e meus sonhos”) em 1923, no auge da vanguarda modernista, apenas um ano após a Semana de 22, encontrando aqui uma predisposição à aceitação das ideias que ele trazia da Europa – os preceitos de Walter Gropius (1883-1969), Mies van der Rohe (1886-1969) e Le Corbusier (1887-1966) – e já empregado pela Companhia Construtora de Santos, dirigida por Roberto Cochrane Simonsen, primeiro intelectual brasileiro a defender o trabalho racional dentro da indústria, seguindo a escola do taylorismo e do fordismo.

Vale, antes de avançarmos aos impactos da vinda de Warchavchik ao Brasil, criar um contraponto a um outro jovem arquiteto, o austríaco Richard Joseph Neutra (1892-1970), que, assim como ele, em 1923 emigrou da Europa, chegando porém aos EUA. Neutra, que já trabalhara com Erich Mendelsohn (1887-1953) e se diplomara em Viena sob a direção de Otto Koloman Wagner (1841-1918), ainda encontraria John Augur Holabird (1886-1945), em Chicago, e Frank Lloyd Wright (1867-1959), em Taliesin, com os quais trabalharia – diferentemente de Warchavchik, que se depara com um país que mal sabe distinguir um engenheiro civil de um arquiteto e onde um mestre de obras poderia assumir tal função, sendo que o curso de arquitetura da Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, só passaria a ser reconhecido 10 anos após a sua chegada.

Contudo, ele não poderia ter chegado a um lugar mais oportuno, pois a província de São Paulo, mesmo possuindo ainda características de uma vila, fervilhava de intelectuais defensores da nova arte como Paulo Prado, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Graça Aranha, Renato de Almeida, Guilherme de Almeida, Menotti del Picchia, Plínio Salgado, Victor Brecheret, Emiliano Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Heitor Villa Lobos e outros. Warchavchik, como não poderia deixar de ser, logo entrou em contato com o grupo modernista de São Paulo, onde conheceu a jovem Mina Klabin, filha de um grande industrial da elite paulista, com quem viria a se casar em 1927, naturalizando-se brasileiro.

Em 1925, Warchavchik, escreve aquele que seria o primeiro manifesto da arquitetura modernista no Brasil, publicado inicialmente em italiano no jornal Il Piccolo no dia 15 de junho, intitulado “Futurismo?“, posteriormente traduzido e republicado pelo Correio da Manhã em 1º de novembro, como “Acerca da Architectura Moderna”. No mesmo ano, Walter Gropius iniciava a publicação dos Bauhausbücher, com a obra Internationale Architektur. Pode-se dizer que poucas e relativas dissonâncias separam seu documento ao do mestre alemão.

No artigo de Warchavchik, são expostas algumas ideias do arquiteto sobre o novo padrão de estética arquitetônica que estava florescendo. Segundo ele, assim como as máquinas que acompanhavam a evolução tecnológica, os edifícios também precisavam se modernizar, pois são verdadeiras “máquinas de morar” – não apenas no sentido das técnicas construtivas, que ficavam a cargo dos engenheiros da época, mas principalmente em relação à “cara” da construção.

A crítica ao ornamento é feita de forma veemente: detalhe inútil e absurdo, imitação cega da técnica da arquitetura clássica, tudo isso era lógico e belo, mas não é mais. Para ele, o estudo da arquitetura clássica deveria servir apenas para dar ao arquiteto um sentimento de equilíbrio e proporção, do contrário, estaríamos fadados a viver em verdadeiras réplicas antiquadas, que destoavam totalmente dos equipamentos modernos, dos costumes modernos, enfim, da vida moderna.

Neste sentido, defendeu fortemente a produção de uma arquitetura livre dos legados do passado, e que refletisse a época da modernidade – lógica e livre de ornatos.

Mesmo tendo em seus conhecimentos extensa cultura clássica e ainda convivido com Marcello Piacentini, o qual publicaria em 1930 o livreto Architettura d’oggi, atacando a nova arquitetura e afirmando que esta lhe parecia um produto efêmero, Warchavchik se mostra fiel ao movimento que se processava e aos seus estudos sobre os novos materiais.

Em 1927, em função de seu casamento, Warchavchik começa a construir para si, na rua Santa Cruz, bairro de Vila Mariana, em São Paulo, aquela que seria considerada a primeira casa modernista do país, concluída em 1928. O projeto, a construção, a decoração, os interiores, os móveis e as peças de iluminação, são de autoria do arquiteto. Mina Klabin Warchavchik, além de contribuir financeiramente com a construção, inclusive dispondo de terreno de sua família para tal fim, colaborou com o projeto paisagístico para o jardim – eventualmente também considerado o primeiro projeto paisagístico moderno do país, embora tal afirmação também encontre divergências.

O projeto da casa deu origem a uma das mais relevantes polêmicas do movimento moderno, provocado pelo arquiteto Dácio de Morais, que criticou asperamente Warchavchik em artigos do Correio Paulistano. O projeto para a casa teve como objetivo a racionalidade, o conforto, a utilidade, uma boa ventilação e iluminação – ideais preconizados por Le Corbusier. Inspirado nas paisagens brasileiras, criou uma arquitetura que se adaptou à região, ao clima e às tradições do país. Participantes da Semana de Arte Moderna de 1922, como Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, Anísio Teixeira, Mário de Andrade, Osvaldo da Costa e Mário de Andrade, opinaram sobre o sucesso de Warchavchik, ao conseguir uma essência nacional na casa sem comprometer o objetivo de romper com os elementos tradicionais da Arquitetura.

A casa, hoje pertencente ao Estado de São Paulo, foi tombada em 1980 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado e reconhecida como Patrimônio Histórico pelo IPHAN, tornando-se um parque. O tombamento se deu por intermédio de moradores da região que queriam impedir a implantação de um loteamento residencial, proposto por uma construtora, para o local.

Apesar desse ser o primeiro exemplo de casa modernista no Brasil, existem quatro pontos básicos que contradizem ao manifesto modernista:
1.Parecia tratar de uma construção em concreto armado, porém o edifício foi construído quase que inteiramente de tijolos, ocultados por um revestimento branco;
2.As janelas horizontais de canto, sob o ponto de vista técnico, não se justificavam numa construção executada com materiais tradicionais, tendo elas acarretado complicados problemas de construção;
3.A solução , que consistia em dar à ala direita da fachada o mesmo aspecto externo da ala esquerda, quando essa correspondia a varanda e não a um interior com ala oposta contradizia a afirmação feita por demais absolutos no manifesto de 1925: “a beleza ade uma fachada deve resultar da racionalidade da planta da disposição interna, assim como a forma de uma máquina é determinada pelo mecanismo, o que é sua alma;
4.A cobertura do corpo principal não era um terraço, conforme se poderia supor, mas um telhado de telhas coloniais cuidadosamente escondido por uma platibanda.

Warchavchik morreu aos 76 anos em seu leito, na manhã de 27 de julho de 1972. Foi enterrado no Cemitério Israelita da Vila Mariana.

Deixa ao Brasil uma herança importantíssima, não só composta por artigos teóricos, como também por obras realizadas, que marcaram definitivamente uma nova fase no campo da arquitetura moderna brasileira.

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